sábado, 30 de janeiro de 2010

Cena a dois, para ser encenada em silêncio

JOAQUIM - Lolô, eu te amo... Você está com medo?
LORENA - Medo? Medo é pouco! Tem muita Lorena na tua mão,
JOAQUIM - E muito Joaquim na tua...
LORENA - E muito Joaquim na minha mão! Claro que tenho medo, não somos inteiros em nós... E se eu morrer, Joaquim?
JOAQUIM - Morre Joaquim contigo.
LORENA - Tenho tanto medo de morrer, e te deixar aqui, com um pedaço pulsante de mim, levando um pedaço teu que deveria pulsar comigo. Tenho medo de precisar ir embora, tenho medo de te deixar e você não conseguir encontrar uma paz. E tenho medo de, no dia-a-dia, ir te machucando, porque pode ser de eu machucar as pessoas, ir te machucando até rasgar a sua alma em dois pedaços irregulares...
JOAQUIM - A minha alma é dois pedaços irregulares... E você faz parte disso.
LORENA - Eu sei, Quim, mas tenho medo que isso doa em você...
JOAQUIM - Então você não quer nem tentar?
LORENA - Oras, se você não estiver com medo, eu encontro coragem...
JOAQUIM - Eu estou com medo, mas tenho mais coragem que medo... Se nos machucarmos, se morrermos, se nos deixarmos, pelo menos teremos vivido algo que, nem que só por um segundo - que seja esse aqui -, deu certo... E por isso valeu a pena. Doer depois também é tão bom quanto amar durante.
LORENA - Entao, Quim, eu te amo... Você está com medo?

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

O meu coração cantando a capella
e eu buscando uma música que te
delineie o corpo e a tua alma nova
Música que cante ao baque surdo
dos nós dos meus dedos apertados
do nós que existia e agora já morreu
O meu coração cantando a capella
e eu buscando em um acompanhamento
alguém que assovie essa minha canção
alguém que me segure muito forte
Até eu me esquecer da dor que sinto
E dos silêncios do meu mundo frio
O meu coração cantando a capella
E eu me esquecendo de morrer, em paz.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

- Cê tá bem, neguinha?
- Não, não, não, não, não, não, não tô nem um pouco bem! Eu me sinto sozinha, apesar de ser tão injusto dizer isso, e eu me sinto fora de lugar, como se eu não pertencesse à minha própria casa, ao meu próprio corpo, e eu nunca senti tanto medo de uma vez, estou com medo do dia de hoje, da semana de hoje, dos meses e do ano que se segue, estou com medo de não aguentar a vida que eu própria preparei para mim, eu estou com saudade de quem eu era há um ano, há dois anos, e eu estou com saudade das coisas que eu vivi, estou com saudade de como eu me sentia em relação a tudo, ou à minha vida, eu estou com saudade de uma companhia que me complete, porque eu estou destroçada...

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Atemporal

Ao temporal:
que tuas gotas sejam a minha saliva
que crêem na vida, como no mundo
pois o tempo não me rege,
nem eu rejo o tempo,
somos pequenas aliterações, metáforas
e apenas convivemos.
A tempo:
não se atrase, meu amor
pois a chuva que está para cair
alagará as ruas, me alagará os olhos
não se atrase, por favor,
que eu passei a vida a lhe esperar...

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Estou indignada!
Quem vem ao meu quarto
- durante a noite! -
para entortar-me os quadros na parede
e desajeitar-me as as fotos no mural?

Então a (vo)vozinha me responde,
bem baixinho,
- São os anjos da guarda,
que vêm em silêncio
lhe discutir o seu metodismo!...

sábado, 16 de janeiro de 2010

Pedido

Por favor!
Livre-me dos meus silêncios!
Faça com que passe
a dor do parto, de quando me partiu
a dor da neve ao redor do meu interior
faça-me derreter...
Pois minha boca selou
um mundo meu, não o atinjo mais!
E foi por você...
Lhe peço... Lhe imploro!
Me toque novamente
A valsa dos seus dedos estalava estrelas
E me enchia de canção
Eras maior do que o Mar
tu eras maior do que o amor.
Volte aqui.
Me complete com o teu silêncio
o silêncio brando e pacífico
de um outro beijo...
Os pratos caíram do escorredor
o caminho para o céu é tão bonito
Posso falar de coisas ruins
ou crer em dias tão claros que me esqueço
- Eu te amo, porra! E não sei o que fazer com essa massa amorfa pairando, não sei se dentro de mim ou ao meu redor. Não sei se posso canalizá-lo ou transformá-lo noutra coisa, ou como me livrar disso. Se eu pudesse, imprimiria meu amor por você nos poeminhas bobos, nas prosas bobas, e jogaria o amor impresso na lata do lixo reciclável, para esquecê-lo... Mas não posso: as palavras têm efeito contrário e o amor me enraiza... Tentaria dispará-lo aos outros, mas é, mais que meu amor, o teu amor. É exclusivo, não posso entregá-lo a outrem. Não posso fazer nada mais que surpotá-lo, suportar-lhe e suportar-me.
As mãos dele procurando as minhas e meu coração implorando por abrigo

sábado, 9 de janeiro de 2010

Cartas Provisórias

Querido,

não sei por que lhe escrevo hoje. Não tenho muito a dizer. As cartas que se seguem não passam de meros rabiscos, traços da minha personalidade que eu rascunhei em papel manteiga e acabaram por escorregar entre meus dedos, antes que eu pudesse decorá-los. Perceba que não estou necessariamente falando com você, mas seja lá o que eu disser, é claro que  te inclui, como sempre. Não preciso que você leia. Eu não sou você.

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minhas são cartas provisórias porque elas não carregam nenhuma verdade que valha o resto de uma vida. Sou da opinião de que todas as cartas são provisórias, uma vez que as verdades costumam mudar durante o tempo. As palavras não são suficientes para eternizar uma verdade: apenas no papel. Dentro de mim, muda tudo, muda o tempo todo.

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não queria lhe perguntar isso agora, mas não consigo evitar: o que é o amor?

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Eu acredito que nunca vou poder responder a essa pergunta. Acredito apenas que amar é algo que vale a pena. Independente de quais as circunstâncias, experiências e finais, vale a pena.

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e daí que ela gosta de garotas? Que ela ame sem moderação suas garotas, que viva por elas, e que ninguém abra a boca para dizer qualquer coisa pejorativa, que ninguém se meta em seu amor, que não tem amarras.

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eu não sei se sei amar. Mas amo.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Helena,

não me pergunte, minha princesa, o que é que tanto escrevo nesse caderno! Escrevo poeminhas bobos de um amorzinho cálido que me tem aterrado! Escrevo apenas bobagens, minhas pequenas descobertas, ou palavras instantâneas que me aparecem e eu tenho medo que me abandonem. Mas tenho vergonha que as leia, com a minha letra manuscrita, toda torta e truncada, e que me ache boba por escrever sobre o meu mundo, fazendo tanto mistério, como se escondesse todos os segredos da humanidade...

domingo, 3 de janeiro de 2010

Nascimento do poeta

JOAQUIM - Vê bem, Lorena, vê bem que teus olhos me enganam menos que os meus. O que está vendo, Lorena?
LORENA - Ora, Joaquim, não vejo muito mais do que você, vejo essa colina, e essas florzinhas que nascem ao pé das árvores, como filhos bastardos de um sonho que não aconteceu. Vejo esse sol, lutando para sobreviver ao afago das nuvens, e vejo essas nuvens, intrometendo-se aos caminhos do sol. E vejo a você, Joaquim, tão perdido quanto essas formigas passeando ao redor do meu pé, que se pôs no meio de sua trilha.
JOAQUIM - Percebe? Você me disse as coisas que eu não pude ver. Talvez, Lorena, talvez eu esteja tão faminto por algo que não sei o que é que tenha me cegado e não percebi! Será que você pode me ajudar a sair daqui, Lô? Escaparia comigo?
LORENA - E escapar para onde, homem? Precisamos ficar aqui, para ver os milagres que estão prestes a nos acontecer. Você nunca sabe quando um milagre vai acontecer. E se as flores voltarem à terra, entrarem pela raiz das árvores e brotarem novamente na copa, quase beijando o sol, que se já terá desanuviado?
JOAQUIM - E as formigas, Lolô, as formigas terão reencontrado o seu rumo?
LORENA - As formigas precisarão de um caminho, e eu não posso fazer esse milagre.
JOAQUIM - Pois os milagres que você me deu são falsos! Tão falsos que as minhas lágrimas também perderam o próprio rumo, e estão vagando descontroladas pelo meu rosto! E eu nem sei o que estão fazendo aqui, não me dói nada...
LORENA - Te dói tudo, Quim. Te dói o mundo, e eu te entendo, porque não há aspirina que resolva, não há anestésico ou tapa na cara que te faça passar a dor... É por te entender que eu preciso ficar aqui com você, mas também preciso que você fique aqui comigo, e nós esperaremos juntos que a dor passe. É a dor de existir, Joaquim.
JOAQUIM - Mas eu existo há muito, e nunca tinha me doído tanto.
LORENA - Não basta existir. É necessário descobrir que se existe. E então dói.
JOAQUIM - Ah, Lô... E o que eu posso fazer para passar?
LORENA - Procure um alento...
JOAQUIM - Um alento? Para a minha dor?
LORENA - Sim, procure algo que lhe faça esquecer, um grande amor, palavras cruzadas, filosofia, a sorte, esse fim de tarde, salvar alguma outra pessoa da dor que ela sente, tentar um novo dia, chorar as lágrimas até que faça sentido...
JOAQUIM - Não... eu preciso procurar mais perto, mais... mais perto, mais perto, mais, mais... Dentro, preciso encontrar dentro de mim. Isso que vai me desabrochar n'algo que me deixe em paz. Eu preciso encontrar dentro de mim algo que me dê paz, algo que me faça acreditar maior, algo que me faça acreditar que existir vale a pena! Preciso encontrar o que é essa angústia, o que é essa bola dentro do meu estômago, como eu faço sair? Preciso me encontrar com a minha alma, ouvir o que ela tem a dizer... Tirar de dentro de mim...
LORENA - Quim... Talvez você pudesse tentar... Não sei, é um caminho sem volta, talvez dolorido, mesmo que florido de flores poucos bastardas. Nos dias de sol, o sol lhe queimará até os pulmões, e quando chover você vai sentir o teu próprio corpo escorrendo das gotas. Mas talvez essa sua bola no estômago, a sua angústia seja necessidade de palavras: talvez o seu corpo esteja te mandando, te ordenando que você escreva, escreva, escreva, escreva, meu amor! Seja poeta, Joaquim, seja poeta e entregue ao mundo suas sensações, Joaquim, seja poeta.

sábado, 2 de janeiro de 2010

Quem foi que disse ao céu que já é carnaval?
Quem permitiu que as cores transtornassem os meus olhos
sem que ninguém sambasse na rua?
Agora esses tons miscigenados
dançam dentro de mim, num ritmo lascivo
e eu não posso deixar de sentir os batuques do meu coração
ao som das cores sambando aos céus,
e se a  minha alma pudesse, voaria junto às nuvens, escolhendo
escolhendo qual cor - azul, vermelho, laranja, roxo, amarelo, -
lhe cabe melhor, se será necessária fantasia
ou apenas imaginação para participar do desfile...

Redenção

... mas você, por favor, não se perturbe com o meu amor! O meu amor, eu bem sei, não dura para sempre. Em mim, o amor dura o tempo do cheiro. Enquanto houver o seu cheiro dentro de mim, te amarei, e nem um dia mais. Portanto, haverá um dia em que eu me olharei no espelho e não me verei com um pedaço teu, e não me sentirei culpada por tê-lo roubado de ti, e é no momento em que não há mais culpa que o amor morre. Então, eu nunca mais lhe sussurrarei essas palavras tontas, entorpecidas e irreais do amor, e estarás livre para me deixar em paz... Meu amor, só não sabemos o tempo que nos vai levar... talvez o tempo te esvaia de mim, átomo a átomo, e talvez demore... Ou talvez um outro cheiro me grude na pele, me grude na alma, nos cabelos, me grude nos olhos, e você... você não mais me verá.
Como acontece a consciência da existência? Penso, logo existo? Sinto, logo existo? Acredito ue me sei um ser vivente quando descubro a morte. Acreditar na morte prevê a crença na vida.

Então, era um ser consciente de sua realidade humana, um ser vivo, pulsante, e sem sentido. Havia, agora, a necessidade de um motivo para seguir em frente.
Por te amar, sinto alguma dor. Por isso, hoje prometo jamais dizê-lo em voz alta. Jamais direi-lhe "Eu te Amo", pois cada vez que essas palavras escoam de meus lábios, o sentido se reafirma e esse amor me doi um pouco mais. Por enquanto, me conformarei em lhe escrever quantas cartas puder - em silêncio -, apenas para alguma distração...

Classificados

Eu procuro algum carinho
Que me seja dado de graça.
Procuro um apoio.
Mas não que eu jogue meu peso todo e sufoque,
Apenas que divida os pesos comigo.
E me diga, nos dias tristes, que é feliz do meu lado.
Procuro paz,
Aquela paz de não se estar sentindo incompleto.
Procuro um abraço
Que me faça esquecer a saudade...
Procuro companhia
Que seja leve, quando possível
Mas, se necessário, que seja triste
Que esteja desconsolada: me disponho a estar junto!
Eu quero conhecer alguém  fundo
Conhecer alguém na alma, no cerne.
Eu procuro, em síntese,
eu apenas tenho procurado amor!
Eu poderia fazer uma ode à minha ingenuidade!
Eu, sofrendo dos meus amores adolescentes
chorando-me deles com tanta seriedade
escrevendo estes poeminhas tortos
bobos, julgando saber de amor

Eu, torcendo por um grande amor
aquele que dure por tantos anos quanto poderei seguir
torcendo por um amor adulto, maduro
Eu, humildemente acreditando
que o amor muda...

E, enquanto isso,
o amor se despedaça no quarto adjacente
O amor está acabando, acabado no quarto ao lado!
Ela sai de lá com os olhos em brasa, transbordando
E ele saiu pela porta da frente, com uma ou duas roupas
Esvaiu-se, como um amor adolescente
Como o meu amor que não devia nada a ninguém.

O amor de gente grande
ah, terrível descoberta!
O amor de gente grande também morre
e é tão mais cruel...