sábado, 27 de dezembro de 2008

Dentro desse chapéu
eu quero guardar:
minha música, o teu abraço,
uma bola laranja,
a minha família, um beijo,
um lenço colorido, um caderno
e uma caneta
solidão, aquela risada
tua, minha, em nós.
Eu escolho girar
nessa roda-gigante de amor.
Eu assumo o risco e espero na fila
e sigo em frente.
Em frente e girando, sempre.
Mas que espetáculo ínfimo e paradoxalmente voluptuoso que há em alguns instantes desse breve viver em si! Em que ponto de todo esse mundo se prendem tais capítulos mais alegres ou mais brilhantes de uma história? Em que momento uma história de uma pessoa passa a ser uma história de um mundo todo? Há de existir nessa vida um vasto quê de-viver em que tudo que vale se torna uma coisa só e um longo suspiro de adeus para sumarizar todo o resto.
Chegou a tal ponto, a tal desespero que concluiu que ali era o fim da linha. Última estação, ponto final. Já tinha sofrido demais. A partir dali, o telefone estaria mudo e o rosto, virado. Nem mais uma palavra. Acabado. Se sentia arrasada e incompetente por ter deixado que a vida chegasse naquele ponto. Mas estava decicido, não daria mais nenhuma brecha para aquela situação.
"Outra coisa: se tinha alguma dor e se enquanto doía ela olhava os ponteiros do relógio, via então que os minutos contados no relógio iam passando e a dor continuava doendo."
(Clarice Lispector - Perto do Coração Selvagem)


E a dor continuava doendo.
E A DOR CONTINUAVA DOENDO.
E a dor SEMPRE continuava doendo.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Comunicado público com destinatário individual e previsível

Senhor Rapaz-que-chegou-de-repente-e-ficou-por-tempo-demais,

Nós, da administração dessa eu-lírico maluca que lhe escreve, o informamos que o senhor acaba de receber uma ordem de despejo. Infelizmente, nós não o queremos mais por aqui, pois tens feito bagunça demais com os sentimentos dessa pobre eu-lírico apaixonada. O senhor tem um mês para juntar as suas coisas aqui dentro, se despedir dos destroços que ainda sobram e partir. Se, dentro desse mês, notarmos qualquer mudança no seu comportamento, essa será sumariamente ignorada, uma vez que nós já conhecemos essas suas reviravoltas para deslumbro. Você não é mais bem-vindo. Por favor, não relute como das outras vezes, o senhor já nos deu muito trabalho e, a ela, sofrimento por demais. Está proibido de tentar qualquer reaproximação, abraço ou palavra carinhosa, se limite a ser educado com nossa menina. Entenda quão delicada é a nossa situação, o estoque de lágrimas logo chegará ao fim, e está sendo difícil recolocar os móveis no lugar e assumir o controle novamente.
Esperamos não ter problemas com o senhor, que sabe que pode facilmente encontrar outra cabeça e/ou coração para importunar e se alojar.
Agradecidamente,

Administração de uma eu-lírica maluca e perdida.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

O ar da existência

Há, então, o medo da ausência. O medo do não-estar. O medo de não estar. Há, por enquanto, um ar etéreo que é o ar que existe entre muitos tantos solavancos. Há a saudade, a saudade e um aperto e uma falta de ar dessa certeza, e há uma certeza, há sempre uma certeza triste. Na verdade, há uma coragem. Há na vida um quê de coragem, um gesto de coragem: o amor. E no fim de uma história, ou depois do fim, o medo? O medo passa. Os solavancos se esquecem. A saudade não vai embora, mas se dispersa. Acomoda. Mas e o espaço, aquele deixado antes do fim da história? O amor ocupa. O amor ocupa e cura os machucados, a dor. Ocupa o silêncio, as lágrimas e o vazio. Se existe algo mais belo do que o amor, isso está guardado para depois. Enquanto não chegamos ao fim (ou depois do fim) dessa história, o apoio está na coragem, essa força que existe e quase nunca encontra uma brecha para aparecer. Se há algo mais belo do que a coragem no amor, isso está guardado para bem depois.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Se por vezes te pareci muito incrédula ou muito loucamente apaixonada, devo admitir que às vezes ajo por impulso, numa atitude quase maquinária, apesar de sempre sonhar com vôos sem mágoa por cima de tudo que já vivi e, principalmente, da vida que me espera a seguir, uma vez que é nesse futuro que estão guardadas as maiores surpresas, vivências e tristezas, como num circo sempre aceso.
Procuraria, dentro daquele microcosmo teu no qual me perdi
procuraria, incansável, um modo de fugir
Ah, como quero simplesmente escapulir do meu desejo
Pois já nem acredito mais que vai ser encontrando a ti
que vou me achar.
Concluí que meu encontro só se dará na ausência tua
ou na minha ausência em ti.
É que existem alguns impulsos que são maiores que eu, eles simplesmente vêm, e eu gosto da sensação de estar atuando sem decidir... Há uma coisa boa em deixar apenas as mãos escrevendo as palavras, sem muita escolha. É bom. Deixar os olhos piscarem e as lágrimas caírem por impulso. É como se tudo estivesse em harmonia, e como se o ato de escrever estivesse em comunhão, sei lá, com o coração, que é um músculo independente, age por necessidade e vontade própria. Ah, que meu coração escolha a poesia pela qual bater, e um mundo inteirinho de luz dourada pra brilhar tanto que as pessoas até duvidem. Eu gosto da comunhão específica e intracelular, intramolecular da existência, que existe entre eu e tudo que represento pra mim mesma. Porque isso é o que eu considero mais puro. O encontro de mim comigo mesma.
Eu nem saberia explicar o por quê de eu estar chorando agora, ainda mais porque não é facil alguém - até mesmo eu! - me ver chorando, já que eu não sou muito dada a esse tipo de entrega. Acho que ando hipersensível ultimamente, por alguma razão que desconheço. Alguma mudança na maré que eu ignoro e absolutamente não controlo.

Composição

A sua letra que é nova
mas, para mim,
a melodia já é antiga.