domingo, 6 de abril de 2014

Lembretes

Eu espalho pela casa bilhetes para você, na cega esperança de que você os leia a tempo de. A tempo de saber que o tempo me talhou assim: como você jamais poderia prever. Com o tempo aprendi a amar o que me amedrontava, talvez você se lembre. Com o tempo descobri, na estrada, a resposta. Descobri nas agridoces curvas do futuro urgência; urgência de ir e voltar. Isso já me destruiu n'algum lugar do passado (talvez você ainda se recorde...). Mas hoje me alimenta: dona de duas casas e de nenhuma, encontro o gozo na travessia. Se você sentir aquela velha náusea da minha ausência me procure em alguma rodoviária, provável que me encontre num ônibus como aquele da última vez, descendo ou subindo irreconhecível, a cada dia transformada, nova e loba, a cada dia com uma nova fome da estrada. E eu vou te sorrir sem medo e falar, sem emitir nenhum som: que de alguma maneira eu encontrei Deus sobre o asfalto, mas que sempre voltarei para este mesmo lugar, onde está eternizado este teu sorriso que chora e este aceno que implora pelo meu retorno. Para te dar um último beijo e poder partir, sempre, e em paz.

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