quarta-feira, 22 de junho de 2011

Mutante

- ... e aí ele me disse: "Nossa, como você tá mudada!"
- e isso não é bom??
- não! claro que não... os que me amavam amavam a pessoa que eu fui, e não quem eu sou. Me entende? eles não amam quem eu sou.
- e daí??
- daí que eu tenho sentido tanto medo de perder, tanto, tanto...
- mas garota, você está crescendo
- e crescer é perder? as coisas que eu construí? as pessoas que eu abracei forte, tão forte que era pra ser um coração só?
- crescer talvez seja perder.
- é tão difícil... eu tinha algo a que me segurar. e aos poucos não há mais. tenho me sentido tão sozinha. às vezes no banho eu deixo a água escorrendo, sabe a água escorrendo quente por todos os poros? eu queria poder esfregar, esfregar tudo, passar sabonete em tudo o que eu vivi, e o que eu vivi não foi pouca coisa,  eu queria poder usar uma bucha com força na minha alma e merecer novamente um amor que já tive. tenho me sentido tão perdida, sabe? perdida no mundo.
- mas você merece ser amada! talvez esteja se tornando uma mulher e isso é merecer amor.
- já viveu isso? se olhar no espelho e, com alguma repulsa, afirmar 'mas isso aí não sou eu!' e então terrivelmente se perguntar 'mas o que é que eu sou?' e não há resposta... já viveu??
- talvez todos vivam um dia.
- esse bicho triste, sem cor, eu não sou esse bicho medroso que faz escarcéu da própria dor. eu sou uma mulher que sofre em silêncio, e sempre fui. sempre, sempre. eu não quero ser esse bicho rancoroso que tenho sido. eu não tenho nada pra me segurar de pé.
- mulheres aprendem a se apoiar nas próprias patas como um bicho que quase voa!
- eu não quase vôo... só quase caio. quando o sol queima a pele de modo desigual, sabe como é? é assim que me sinto, só que na alma.

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